Rádio Sucata: reciclando e reafricanizando o Brasil

Em meados de 2013, surgiu em Mogi Mirim (SP) o grupo musical Rádio Sucata, com a proposta de revalorizar a cultura afro-brasileira por meio da interdisciplinaridade entre diversos segmentos artísticos. O grupo foi criado a partir da ideia de montar instrumentos musicais com material de descarte.

Paulo Salmaci, fundador e diretor do Rádio Sucata, conta que tudo começou quando ele encontrou um tubo de papelão parecido com madeira na rua. “Levei o tubo para casa na intenção de transformá-lo no corpo de um tambor, mas esse tubo ficou encostado bastante tempo. Em meados de 2013 retomei a ideia de construir o tambor e comecei um processo de experimentação”, explica.

“Assim surgiu o tubak, tambor feito com corpo de papelão, aro de arame de pneu e pele de garrafa PET, o primeiro instrumento musical do que viria a ser o Rádio Sucata. Utilizei apenas materiais de descarte que estavam em casa e o resultado foi impressionante, e assim percebi que era possível construir instrumentos musicais de alta qualidade com materiais que até então eu descartava como lixo.”

Desse instrumento construído surgiram as primeiras reuniões com outros artistas na casa de Salmaci. O intuito era estruturar um projeto e lapidar ideias para o que viria a ser o grupo – que além de trabalhar a partir da arte e da inovação, criando instrumentos musicais com material de descarte, definiu como sua linha de atuação e principal objeto de estudos e experimentação a cultura afro-brasileira e a indígena. Ainda em 2013, o Rádio Sucata fez sua primeira apresentação como “um grupo artístico formado por artistas distintos”.

Atualmente o Rádio Sucata atua em várias frentes: shows autorais, shows cover, espetáculos teatrais, contação de histórias e oficinas diversas para vários públicos. “Trabalhar com a memória da cultura africana e afro-brasileira é fundamental para nos compreendermos como sujeitos”, afirma Salmaci. “Essa convergência do meu interesse em percussão – a percussão brasileira tem influência de variados elementos da cultura africana – com o interesse de Carolina Desoti [produtora e pesquisadora do grupo] em pesquisar as diversas culturas que contribuíram para a formação da nossa identidade nacional culminou no espetáculo musical Reafricanizando o Brasil.”

O show mistura linguagens musicais, fazendo a contextualização histórica por meio de textos poéticos e movimentação cênica. A linha condutora da apresentação é a influência das culturas latino-americana, indígena e, principalmente, africana na construção da identidade cultural dos brasileiros.

Durante as pesquisas que culminaram no espetáculo, Carolina Desoti conheceu o cantor e dançarino congolês Tyfsnow Ndangi, que está refugiado no Brasil. Ele foi fundamental na consolidação do projeto e auxiliou o grupo, compartilhando seus conhecimentos sobre a cultura congolesa. Hoje, Ndangi é mais um integrante do Rádio Sucata, que também conta com Rodrigo Peguin (produtor), Rodrigo Goi e Renan Rodrigues (percussionistas), Maria Angélica Urbano (atriz), Tiago Galdino (vocalista), Otávio Antoniacci (artista) e Ricardo Arantes (artista, escritor e poeta).

O grupo já acumula mais de cinco anos de atuação e tem recebido elogios e prêmios. Em 2016 e 2017, o Festival Lisanga Awards o premiou na categoria Criatividade. O festival é dedicado à cultura africana e organizado por imigrantes e refugiados que vivem em São Paulo, e tem como objetivo reconhecer instituições, coletivos e pessoas engajadas na temática migratória. Em lingala, idioma falado principalmente na República Democrática do Congo e em Angola, lisanga significa união.

Em 2016, o Rádio Sucata foi certificado como Ponto de Cultura e desde então faz parte da Rede Cultura Viva, do Ministério da Cultura.

A meta do grupo para 2018 é estrear o show Reciclando a MPB, que apresenta uma releitura de diversas músicas consagradas, todas tocadas com instrumentos feitos de sucata.

Conheça um pouco mais do trabalho do Rádio Sucata em seu site oficial: radiosucata.com.br.

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