por Cristiane Batista

Professor, escritor, radialista, ex-diretor pedagógico do bloco afro Ilê Aiyê. São tantas as áreas de atuação de Jônatas Conceição que fica difícil definir essa grande personalidade do movimento negro baiano. Agora, com o apoio do programa Rumos Itaú Cultural 2019-2020, toda a sua obra foi reunida em um livro digital, disponível para download gratuito neste site. O projeto reúne cerca de 500 páginas da produção do intelectual e militante, morto precocemente aos 54 anos, em 2009, em decorrência de um câncer.

A iniciativa e a realização de Obras reunidas – Jônatas Conceição são de outro nome fundamental da luta antirracista brasileira. Ana Célia Silva, irmã de Jônatas, é pedagoga, com pesquisas pioneiras sobre a representação do negro nos livros didáticos no Brasil. “A importância de Jônatas é inconteste nas pesquisas sobre história e cultura africanas e afro-brasileiras, tanto em relação a seus contos e poemas quanto à sua atuação no Ilê Aiyê”, diz ela, professora titular aposentada da Universidade do Estado da Bahia (Uneb).

Foto em preto e branco de Jônatas Conceição. Ele é um homem negro, usa barba e óculos de grau. Na imagem se vê seu rosto de perfil, voltado para o lado esquerdo do enquadramento.
(imagem: divulgação)

O livro reúne textos lançados originalmente na série Cadernos negros, além de artigos sobre história e cultura afro-brasileiras. Futuramente, o material deve ganhar tiragem impressa de 300 cópias. Além das obras completas, o site traz informações biográficas, fotos, um documentário sobre o projeto e vídeos com poemas do autor.

Entre as obras de Jônatas disponibilizadas pelo projeto estão Reflexões sobre o ensino de português para a escola comunitária, Miragem de engenho, Outras miragens de engenho, Quilombo de palavras – a literatura dos afro-descendentes, Vozes quilombolas – uma poética brasileira e Zumbi é o senhor dos caminhos. São trabalhos do autor publicados desde o final dos anos 1980 até sua morte, por editoras da Bahia e da Alemanha.

Nascido em 1952 no bairro soteropolitano de Engenho Velho de Brotas, Jônatas começou a publicar seus primeiros poemas em um jornal paroquial em 1967. Aos 22, concluiu o curso de letras na Universidade Federal da Bahia (UFBA). Em seguida, iniciou em Campinas (SP) um mestrado não concluído com o tema “A vírgula não foi feita para humilhar ninguém” – texto agora disponibilizado na coletânea. Em 2003, concluiu um mestrado no Instituto de Letras da UFBA, com a dissertação Vozes quilombolas – uma poética brasileira.

Em 1978, Jônatas participou ativamente da fundação do Movimento Negro Unificado (MNU) de São Paulo e, já no ano seguinte, uniu-se ao MNU de Salvador. No movimento, entre 1980 e 1990, coordenou o jornal Nêgo. No final da década de 1980, contou com a parceria da irmã Ana Célia na criação do quadro Fala crioulo, veiculado no Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (Irdeb), um marco da mídia preta soteropolitana. Sua atuação ganhou maior escala no Ilê Aiyê, como idealizador e coordenador do Projeto de extensão pedagógica, focado na formação de professores e professoras para a educação pluricultural, implementado nas escolas públicas da zona da Liberdade, em Salvador, entre 2000 e 2005.

“Nossa formação sobre a problemática racial da sociedade brasileira não se deu na família nem na escola. Ela começou com a fundação do Ilê Aiyê e do MNU”, lembra Ana Célia. “A representação social da diversidade humana continua recalcada, contudo hoje inúmeros professores e professoras pesquisam o racismo nos materiais didáticos e apresentam inúmeras medidas de sua desconstrução na prática pedagógica.”

Jônatas deixou 231 fitas de rolo com o conteúdo do programa Afro Bahia, que ele idealizou e apresentou, entre 1982 e 1993, na Rádio Educadora/Irdeb. Nesse programa, ele entrevistou artistas e outras personalidades e trouxe uma rica seleção da música negra mundial. As fitas devem ser digitalizadas por meio de um projeto gerido pela família.

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