por William Nunes de Santana

 

Desde a sua fundação, na década de 1950, a Casa do Povo sempre esteve muito ligada ao seu entorno imediato. Na verdade, ela é um produto do bairro, um lugar de encontro de associações, coletivos e iniciativas do Bom Retiro e região, na capital paulista. Por isso não é surpresa que a atuação da instituição neste momento de pandemia se divida em ações off-line e on-line que dialoguem com o seu local e o seu público.

A pandemia expõe ainda mais as urgências vindas das desigualdades sociais. O momento é crítico para a população em situação de vulnerabilidade social; assim, novas parcerias foram desenvolvidas para atender a demandas recorrentes de produtos de higiene pessoal, de limpeza, alimentos e leite em fórmula para bebês, máscaras, cobertores e agasalhos, além da necessidade de tecer novas solidariedades – há carência de oportunidades justas de trabalho e de criar autonomia financeira, por exemplo.

Ações da Casa do Povo dialogam com o seu local e o seu público (imagem: Thiego Montiel)

Acompanhe as frentes de ação da Caso do Povo.

A criação de um amplo grupo de voluntariado foi fundamental. Logo no início de abril foi lançado um convite aberto para quem pudesse se juntar à Casa do Povo – tomando todos os cuidados em analisar o perfil dos interessados. Dois meses depois, 90 pessoas estão cadastradas e 40 delas estão atuando ativamente. O grupo se divide nas mais diversas tarefas: elaboração de material informativo, transporte de mercadorias e doações, atendimento presencial para auxílio emergencial, articulação com costureiras na produção de máscaras, contato telefônico com famílias cadastradas para receber cestas básicas, organização de material no espaço físico da instituição, registro fotográfico da campanha etc. A chegada de uma coordenadora focada na organização, na logística e no relacionamento com os voluntários foi essencial para o bom andamento e o engajamento nas atividades.

"Devido à pandemia, a Casa do Povo se voltou para o ambiente on-line, mas, principalmente, para o off-line. Em um bairro tão vulnerável como o Bom Retiro, deixá-la de portas fechadas nos parece descabido. Nós nos arriscamos então para além do que costumamos fazer. Assim encontramos uma nova Casa do Povo dentro da Casa do Povo e outro bairro no nosso próprio bairro. Este momento é uma ocasião trágica, porém única para tecer novas e duradouras redes de cuidado e solidariedade”, diz Benjamin Seroussi, diretor-executivo da instituição.

Em foto de 1944, voluntários que viriam a construir a Casa do Povo fazem um mutirão para o envio de roupas, remédios e insumos aos exilados da Segunda Guerra Mundial. (imagem: Casa do Povo / Arquivo Vivo)

Uma foto do acervo funcionou como uma bússola num momento em que a equipe se questionava sobre a melhor forma de atuar. Na imagem, de 1944, voluntários organizam um mutirão para o envio de roupas, remédios e insumos a exilados da Segunda Guerra Mundial. A lembrança reforçou o desejo de agir e inspirou a abertura das frentes de ação.

“A cultura, e consequentemente os espaços culturais, precisa extrapolar as divisões entre on-line e off-line, dentro e fora, público e profissionais, arte e social", pontua Benjamin.

Programação suspensa no ar

As atividades on-line foram elaboradas a partir do pressuposto de que a Casa do Povo é uma instituição cujo principal foco consiste em proporcionar encontros. Dessa forma, os conteúdos não foram apenas transpostos do off-line para o on-line; houve o cuidado de traduzir, de fato, esses encontros para o digital. A programação suspensa no ar surgiu no contexto da pandemia, e justamente por isso ela visa dialogar com este momento excepcional. É preciso olhar para o agora e para as mudanças que a pandemia impõe – por isso, essa programação acontece sem uma grade fixa, deixando espaço para respiros, na tentativa de acompanhar as incertezas do momento e refletir sobre elas.

O formato começa pela ideia de correspondência, enviada por e-mail na forma de newsletter semanal. Os conteúdos publicados procuram articular as frentes de ação da Casa do Povo, os coletivos em residência e as pessoas do território, propondo reflexões e leituras acerca do momento atual sob diferentes perspectivas, olhando tanto para a instituição quanto para o entorno.

Esse conteúdo, que começa na caixa de e-mail criando uma relação mais pessoal, se desdobra também nas redes sociais, em forma de texto, vídeo, imagem e som – ou tudo junto.

Confira também a última edição do jornal Nossa Voz.

Rádio Ânsia

Um dos novos projetos é a Rádio Ânsia, plataforma de encontros sobre ecologias queer proposta pelo coletivo Universidad Desconocida (UU). Com apresentação do artista Jonas Van, as conversas giram em torno da coexistência entre seres vivos, de saberes dissidentes e de contracondutas em alimentação.

A rádio é uma continuidade da Cozinha Aberta, ação do coletivo UU que, em 2019, preparava e distribuía refeições veganas gratuitamente na Casa do Povo. A suspensão das atividades presenciais trouxe a necessidade de transpor esse encontro físico proporcionado pelas refeições para um ambiente on-line.

Assim, a Rádio Ânsia convida o público a estar junto, mesmo que distante, na hora do almoço. As transmissões acontecem às sextas-feiras, das 12h às 13h – além de uma reprise às terças-feiras, às 17h. Os programas vão ao ar no próprio site da Casa do Povo – acesse aqui – até o dia 10 de julho. Em breve, devem ser disponibilizados em plataformas de streaming.  

 

A série Por Aí divulga ações e atividades de instituições e projetos parceiros do Itaú Cultural espalhados Brasil afora. Você pode acompanhar em nosso site, por meio da tag Por Aí, e nos destaques do nosso perfil no Instagram (@itaucultural).

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