por Heloísa Iaconis

Entre os shows que embalam o mês de maio no Itaú Cultural há dois espetáculos que reforçam o vínculo do instituto com o Auditório Ibirapuera: no dia 16, a banda Aldeia fincou-se em um repertório diverso, do choro ao samba; já no dia 23, o palco será comandado pelo Coro da Escola, responsável por fazer releituras de compositores como Dona Ivone Lara, Pixinguinha e Cartola. As duas formações ganharam vida na Escola do Auditório, projeto que oferece um curso de música brasileira a até 170 estudantes da rede pública de ensino que residam em São Paulo. Confira a trajetória desses coletivos.

Com a benção de Proveta

Aldeia surgiu de uma vontade comum entre amigos: após integrarem a Orquestra Furiosa do Auditório (com exceção de uma pessoa), disciplina que dá aos alunos a experiência de uma big band, eles decidiram se reunir em torno de uma seleção de músicas nacionais. Definido o eixo, procuraram Nailor Proveta, liderança da Banda Mantiqueira, que não escondeu o entusiasmo diante de uma iniciativa de artistas novos, todos com idade entre 17 e 26 anos. “Ele ficou empolgado com a nossa ousadia e nos ofereceu arranjos que não haviam sido gravados pela Mantiqueira”, recorda Danilo Rocha, saxofone tenor 1 do grupo. A oferta foi aceita e, logo como um primeiro estímulo, tinham em mãos uma obra de João Bosco. Ensaiaram e muito aprenderam com o mestre clarinetista. Até que, em dezembro de 2018, estrearam em uma produção simbólica: em um sarau realizado na casa de Proveta, surpreenderam o professor e mostraram o que tanto ele os havia ensinado.

Aldeia | foto: Marina Aguiar

A apresentação-presente marcou o início de uma rotina mais organizada de preparo: em 2019, todas as sextas-feiras, os participantes se juntam e recebem orientações de Proveta. “Ele nos ajuda bastante. Por exemplo: se queremos tocar uma bossa nova, ele traz uma para nós. O mesmo ocorre com outros estilos. Os ensaios são aulas impagáveis”, conta Danilo. Das várias lições que o mentor passou para a turma, a mais importante conduz cada nota dos pupilos: por aí, existe uma infinidade de músicos que tocam; contudo, é preciso ir além – deve-se ter amor por seu instrumento, trabalhar com o coração, cultivar uma vontade enorme de defender, sempre, a música do Brasil.

A busca por produzir algo que faça sentido verdadeiramente aplica-se também ao show realizado no Itaú Cultural. “A instituição salvou o Auditório Ibirapuera. Além disso, trata-se de um lugar onde gente de renome mostra o seu trabalho. Foi uma responsabilidade e um privilégio imensos, uma oportunidade que nos fortaleceu”, sintetiza Danilo.

Dos mares às esquinas

O Coro da Escola nasceu como um complemento prático da matéria de canto popular. A princípio, funcionava como um braço da Orquestra Brasileira do Auditório (OBA) e, aos poucos, a trupe desenvolveu, de modo paralelo, uma pesquisa acerca da sonoridade na música a cappella e orquestral. Daniel Reginato, regente do grupo desde 2008, encanta-se com a entrega dos cantores nesta frente dupla: tanto em cena quanto no estudo. “Ver esses jovens cantantes se lançarem ao desafio de cantar solo ou em pequenas formações, envolvendo-se na construção dos roteiros, dos textos poéticos e dos figurinos, é inspirador”, enfatiza Daniel.

Coro da Escola do Auditório | foto: Rogério Vieira

Indicado pelo maestro Vanderlei Banci, regente da OBA, Daniel, por um tempo, encabeçou o conjunto ao lado de Jonas Nogueira. Em um momento posterior, assumiu a regência sozinho e, hoje, acumula demais funções: arranjador, diretor e educador (aconselha docentes e conduz, pedagogicamente, preparações vocais e corporais). Nos espetáculos do coro, intercambiam-se as linguagens musical e cênica, junção que resultou em concertos sobre as águas apaixonantes de Vinicius de Moraes e Dorival Caymmi e sobre os ventos de Paulinho da Viola. Agora, o grupo prepara uma montagem que homenageia o Clube da Esquina e será exibida no Itaú Cultural. Todos esses números, é certo, descortinam o processo coletivo e imersivo que marca essas vozes, vozes sensíveis às nuances de interpretar músicas repletas de brasilidade.   

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