A Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo (SMC/SP) está realizando um mapeamento dos coletivos existentes na cidade a fim de estruturar ações culturais em parceria com esses grupos, articuladas com outras secretarias.

Malu Andrade, coordenadora de inovação da SP Cine (agência de fomento à produção, à distribuição e à exibição de obras audiovisuais na cidade de São Paulo, criada em dezembro de 2013), comentou essa iniciativa e sua experiência como atuante do coletivo Baixo Centro.

Malu Andrade é mestranda em história da arte e fundamentos da arquitetura pela Faculdade de Arquitetura da Universidade de São Paulo (FAU/USP), com ênfase em acervos digitais de vídeo, e especialista em estéticas tecnológicas pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), com ênfase em museus virtuais. Produtora cultural, ela teve passagens por instituições culturais de São Paulo de diversos portes.

Observatório: Entre as ações da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, há um levantamento dos coletivos existentes na cidade. Quais são os parâmetros que estão sendo utilizados para definir um coletivo cultural e quais são as principais características dos coletivos até então mapeados?

A SP Cine iniciou um mapeamento bem abrangente. Queremos entender como os coletivos se enxergam e como estão. Não damos os parâmetros a priori, estamos construindo juntos. Perguntamos quais são os princípios, se possuem ou não CNPJ, se têm sede física ou não, se são apenas virtuais, se seus membros se constituem em outros coletivos etc.

Até agora, verificamos que a maioria dos coletivos não atua pontualmente em uma só área da cidade. Eles se articulam entre si para realizar ações múltiplas. Ou seja, a visão de grupos articulados em torno apenas de uma região e com um foco muito específico, como acontecia alguns anos atrás, está mudando. A rede é um dos motivos para tal mudança. Tanto que, ao perguntarmos se o coletivo possuía sede própria, um terço disse ter “sede virtual”. Outro ponto que chama atenção é que a maioria esmagadora trabalha de forma horizontal ou em grupos de trabalho; essa coisa de ter uma liderança que responde pelo coletivo não se aplica mais.

Agora a SMC/SP lançou a plataforma Mapas Culturais, assim será possível mapear a atuação desses coletivos por toda a cidade por meio de suas ações.

Observatório: Como a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo tem se relacionado com esses coletivos culturais? Quais são os projetos e as ações previstos?

A SP Cine tem grande interesse em trabalhar cada vez mais com os coletivos culturais. Neste momento, estamos em uma parceria com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano [SMDU/SP] para a realização de uma mostra de curtas-metragens nas ruas de São Paulo, com exibição de curtas escolhidos por meio de votação popular. Em breve, devemos lançar um novo projeto também em parceria com a SMDU/SP e o Festival do Minuto que tenha o plano diretor como foco.

O Edital Ruas e Redes também tem uma linha apenas para coletivos culturais que trabalham com cultura digital.

Observatório: Muitos desses coletivos estão ocupando espaços irregularmente, e ainda não se tem um instrumento jurídico que permita contornar essa situação. Dentro da secretaria, vislumbram-se caminhos possíveis?

Como disse anteriormente, estamos mapeando como os coletivos se constituem para entendermos como podemos trabalhar da melhor maneira. Até o presente momento, os coletivos estão divididos entre aqueles que possuem algum instrumento jurídico (empresas, MEIs) e aqueles que se constituem apenas como pessoas físicas. As duas parcerias com a SMDU/SP foram pensadas, por exemplo, para pessoas físicas, facilitando o acesso.

Observatório: Quais exemplos ao redor do mundo de relacionamento entre o poder público e os coletivos culturais estão servindo de referência para as iniciativas da prefeitura (se houver exemplo a ser seguido)?

Olhamos para a nossa realidade e para as particularidades de uma cidade do tamanho de São Paulo, mas cidades como Barcelona, Berlim e Londres possuem um histórico interessante de ações de coletivos e ocupações culturais.

Observatório: Como ex-participante do Baixo Centro (http://baixocentro.org), fale um pouco da metodologia de trabalho, dos principais problemas enfrentados, das mudanças realizadas ao longo das três edições e dos principais desafios para que o movimento tenha vida longa na cidade.

Eu estou afastada do Movimento Baixo Centro há mais de um ano e meio, acompanho com interesse o que o movimento vem realizando por meio dos amigos que ainda fazem parte e da lista de e-mails, que é bastante ativa [baixocentro@googlegroups.com]. O mais interessante no movimento é o fluxo sempre constante de participantes, não é algo estático. Muitos de seus membros vêm e vão (literalmente, já que muitos não moram nem mais em São Paulo) e se reorganizam em outros coletivos para a realização de outros trabalhos.

Durante o festival, o número de pessoas interessadas em ajudar a fazer acontecer é enorme. Na edição de 2013, foram criadas várias listas de e-mails para grupo de trabalho, algumas reuniões juntavam algumas dezenas de pessoas na Casa da Cultura Digital. Do “núcleo duro” no início dos trabalhos, formado por umas dez pessoas, até os dias do festival, o número de pessoas relacionadas na produção chega a quadruplicar.

Neste ano, o festival verticalizou na proposta do artista produtor, presente já desde a primeira edição. Por ser um festival colaborativo, a questão de envolver os responsáveis pelas atividades em todas as etapas do processo sempre foi uma preocupação, e neste ano cada proponente era responsável por sua atividade. O Baixo Centro fez a divulgação e criou bases para que toda a programação acontecesse, mapeando e emprestando equipamento. Para quem acompanhou de fora o processo, como foi o meu caso, acredito que foi uma decisão interessante explorar os próprios limites do formato colaborativo, uma vez que no ano passado foram feitas mais de 530 atividades e o arrecadamento via Catarse foi de 72.250 reais. Se pensarmos em relação ao primeiro festival, em 2012, com 137 atividades e um orçamento na mágica de 17 mil, é um pulo e tanto. O mais interessante do Movimento Baixo Centro, ao meu ver, é o que disse antes, ser um espaço de colaboração múltipla e fluida; o festival é apenas uma das contribuições.

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