por Victória Pimentel
Zenaide Paludo se tornou contadora de histórias sem querer. “Foi lá em Curitiba”, ela conta. “Durante a faculdade, uma amiga perguntou se eu queria contar a história da cidade para um público de crianças que visitavam o Parque Universidade Livre do Meio Ambiente.” Hoje atriz e educadora, Zenaide via a amiga contando a história de Curitiba para as crianças e ficava encantada com seu jeito de captar a atenção dos ouvintes. Chamada pelo desafio, foi assim que teve sua primeira experiência na contação de histórias e, desde então, a utiliza como recurso fundamental em seus projetos de arte-educação. Nos dias 11 e 12 de março de 2017, Zenaide esteve no Itaú Cultural junto do músico João Jorge e promoveu uma oficina de contação de histórias, misturando brincadeiras, música e cultura popular.
Em roda, as crianças tinham à sua disposição uma série de objetos que ganhavam novas funções e, a partir dessas novas utilidades, o grupo começou a criar uma história. “Foi uma improvisação. As crianças e os adultos iam falando o que parecia tal objeto, e fomos contando uma história e incluindo personagens”, Zenaide conta. O momento de criação foi incrementado com músicas e brincadeiras, como a ciranda. Segundo a artista, a brincadeira é a chave da arte-educação para crianças.
O brincar na arte-educação
Durante a faculdade de artes cênicas no Paraná, Zenaide foi convidada para dar aula a um grupo de crianças em situação de risco, em um projeto da prefeitura da cidade de Araucária. “Eu percebi que dar aula de teatro àquele público exigia de mim mais do que apenas dar uma aula. Eu tinha de ser uma contadora de histórias, uma palhaça – e muito mais interessante do que a rua, já que era um projeto que as crianças frequentavam voluntariamente”, explica. Ela passou a estudar e buscar materiais que atraíssem as crianças, percebendo que, quanto mais destas iam para a aula, maior resultado tinha o seu trabalho.
Zenaide, que já trabalhou com crianças de escolas públicas e particulares, com outros professores, com idosos e até com crianças em Angola, na África, conta que a abordagem varia de público para público, mas defende que não existe uma técnica específica e que, independentemente do método adotado, nada precisa ser forçado. Ela fala sobre a experiência que teve em Diadema, cidade na Grande São Paulo, quando dava aula a crianças de 7 a 12 anos: “Eu sempre utilizava o livro, mas como uma brincadeira: o livro como um brinquedo”. As atividades ocorriam em bibliotecas públicas, lugares que até então não eram frequentados pelas crianças. “Eu não cheguei e falei: 'Pessoal, vamos pegar o livro?'. Não, eu só utilizei o espaço como cenário. Não peguei nenhum livro na mão, eu dava brincadeiras dentro de uma biblioteca”, explica.
Segundo a educadora, a ideia é se aproximar dos alunos através de uma abordagem indireta e atípica, que valoriza o lúdico. “Talvez seja muito assustador para a criança que ela tenha de estudar tanta coisa e não possa brincar”, diz. “Mas, se ela entende que brincando também chega ao aprendizado, ninguém sofre. Eu acho que a arte-educação tem essa função, e seria interessante que todas as disciplinas aproveitassem isso. É brincando que a gente chega lá.”
Com prazer, o retorno do trabalho
“Quando eu era criança, morava num sítio com os meus pais e a gente sempre ia na casa dos vizinhos à noite. Era uma coisa comum no interior. Eles acendiam uma fogueira e, em volta dela, começávamos a contar histórias. Era sempre muito prazeroso”, conta Zenaide sobre suas primeiras experiências, ainda na infância, como espectadora de histórias contadas. Hoje, ainda que a educadora lance mão de diversos recursos – uso de figurinos e adereços, manipulação de objetos, jogos e brincadeiras –, a contação de histórias é um dos elementos centrais nas atividades que propõe. “Quando você conta uma história, é como se tivesse dando colo à criança. Ela envolve muito”, diz. “E, se você gosta da história que está contando, não tem erro! Você não precisa de nenhum recurso.”
Com paciência e dedicação, o trabalho tem resultado. Em Salvador, Zenaide ministrou um curso de formação de leitor para pedagogas: “Naquele caso, a gente precisava fazer com que as professoras entendessem que seus alunos só leriam se elas lessem”. Entre os aspectos abordados nas aulas, a partilha de material era essencial. “Eu compartilhava textos que chamavam minha atenção e mostrava a elas: ‘Olha como também é salvador fazer a leitura de algo que mexe com a gente!’. Eu puxava por esse aspecto. Levava pequenos contos, contos de que eu gostava muito. Demorou para que elas também compartilhassem textos dos quais gostavam. Eu não pedia, mas eventualmente aconteceu.”
Em Diadema acontecia uma situação semelhante. “Eu não pedia lição de casa às crianças, não pedia que elas escrevessem nada. Mas então uma criança chegou com uma poesia para mim, dizendo: ‘Olha o que eu escrevi!’. Isso pra mim é o reflexo do meu trabalho. Se o aluno faz uma poesia espontaneamente, é porque chegou a mensagem.” Zenaide ressalta ainda que o processo tem de ser prazeroso: “Eu mostrava o meu prazer por aquilo. Se você não tem prazer no que está fazendo, dificilmente a criança vai te ouvir”.