por Cristiane Batista
“Eu me entrego com amor para o público com o objetivo de divertir, emocionar e fazer pensar”: essa é uma frase de Eva Wilma Riefle Buckup (conhecida, na intimidade, como Vivinha), que saiu de cena aos 87 anos, no dia 15 de maio de 2021, em razão de um câncer de ovário. Eva Wilma seguirá vivíssima nas lembranças de amigos, colegas, familiares e uma infinidade de fãs, que puderam acompanhar as sete décadas de carreira comemoradas no ano passado.
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Eva sempre fazia questão de lembrar: sua primeira grande vitória na vida foi a aprovação para o Balé do IV Centenário de São Paulo, aos 16 anos. Foi só a primeira das incontáveis vitórias artísticas que a transformaram em uma profissional completa e competente, amada pelo país. Com o diretor de teatro José Renato Pécora (1926-2011), fundador e idealizador do Teatro de Arena de São Paulo, aprendeu a representar com o público à sua volta. Já Antunes Filho (1929-2019) a ensinou os princípios da dialética, a lei dos contrários que prevê a modificação da natureza, da sociedade e do pensamento humano. Esses ensinamentos ela levou para as atuações no teatro, no cinema e na televisão, em 40 novelas, 26 minisséries, especiais e séries, 37 peças e mais de 20 filmes interpretando personagens cômicos, dramáticos, bons e maus.
Filha única (“desgraçadamente, mas me aproveitei disso”, ria) de mãe concertista e pai que tocava piano de ouvido, sempre incluiu a música em seu trabalho. Participou do musical Ó que delícia de guerra nos anos 1970 e, passados os 80 anos, resolveu lançar-se também como cantora, ao lado do filho, o compositor, cantor e violonista John Herbert Jr., e do pianista, cantor, diretor musical e preparador vocal William Paiva no espetáculo Casos e canções, recital que rodou o Brasil em duas temporadas de sucesso.
“Eva Wilma era impecável. Pontual, aplicada, sempre maquiada e muito cheirosa. Participava de tudo, fazia sempre questão de indicar a melhor luz em cena para todos e era muito generosa. Uma artista com tantos anos de carreira e que estava sempre aberta e disponível a novos aprendizados. Ela também ajudou a construir minha pesquisa científica”, conta Paiva, autor do livro A voz do corpo: reflexões musicais, movimento e comunicação, professor de Eva e seu diretor musical.
Em Casos e canções, Eva convidava o público a embarcar em uma viagem por algumas das músicas e imagens que se eternizaram e marcaram sua memória e a do país. Antes ou depois de cada composição, uma pausa para contar um causo, fazer uma homenagem a algum artista ou colega – como à Inezita Barroso, com quem teve aulas na adolescência, em “Uirapuru” e “Azulão”. Com “Bom dia, amigo”, relembrava o amigo Baden Powell e a época em que ela morava no Rio de Janeiro, “ao lado do Beco das Garrafas, onde nasceu a bossa-nova, onde os artistas se reuniam para um último drink” (fazia sempre questão de frisar). Incluía ainda “Violão vagabundo”, tema da personagem Raquel, uma das gêmeas que Eva interpretou em Mulheres de areia, novela exibida pela TV Tupi em 1973, e que movimentou o Brasil e levou multidões à cidade de Itanhaém, onde as cenas de praia eram gravadas.
Também leitora contumaz e afeita à tecnologia, estava presente nas redes sociais. Mas avisava: “O grande perigo é o excesso da internet, é você parar de pensar direito e, portanto, parar de ler. Mesmo que tenha lido resumidamente as notícias no digital, não abro mão de ler os jornais diariamente, detalhadamente. Mergulhar em um livro bom é algo indescritível!”, dizia.
Pelas redes, antes de ser internada, Eva postou uma foto ensaiando o texto para gravar o filme As Aparecidas, do diretor Ivan Feijó, com a legenda "quem tem a arte na veia sabe que o show tem que continuar". Como cantava em “O trenzinho do caipira”, de Ferreira Gullar e Heitor Villa-Lobos, agora Eva Wilma está “correndo entre as estrelas a voar. No ar, no ar”. Voe, Eva!