A quadrinista Ana Luiza Koehler não quer só entreter ou tocar o leitor: o seu desejo é que, por meio do segundo volume de Beco do Rosário, sejam abertos olhares para a cidade no tempo. Isso porque o espaço comum, esse de ruas e avenidas, ganha protagonismo na HQ, projeto apoiado pelo Rumos Itaú Cultural. A Porto Alegre (RS) dos anos 1920, época de urbanização intensa, chega ao presente através da aventura de um trio de amigos: Vitória, uma inconformada, Teo, engenheiro recém-formado, e Frederica, mulher insatisfeita. Eles e a capital gaúcha acabam por se fundir, assim como bico de pena e aquarela se unem à pesquisa histórica. O resultado dessas junções está pré-venda no site da editora Veneta até 31 de julho – e, depois, a possibilidade de compra on-line permanece.

Para estar pronto, concluído com cheiro daquilo que sai do forno, o livro passou por um tanto de etapas: da vontade de Ana Luiza de reconstruir a trajetória da cidade à publicação independente, em 2015, do primeiro volume; do material vasto à seleção no programa de fomento; dos esboços à arte final. “A última fase levou mais ou menos um ano, com algumas interrupções em função do doutorado que fiz nesse período. Foi um processo em que aprendi muito sobre colorização. Busquei, principalmente, aperfeiçoar minhas habilidades como pintora – o que acontece, creio, de modo natural ao longo de páginas e páginas em que se utiliza aquarela”, explica a desenhista.

Além do aprimoramento técnico, a artista enfatiza ainda o fortalecimento do seu potencial narrativo, uma vez que o trabalho com histórias em quadrinhos se constitui um desenvolvimento constante. E todo esse percurso se completou com encanto semelhante ao do início. Quer dizer: o fascínio de Ana Luiza pelas diversas questões que envolvem a tônica da modernização e da memória brasileiras se manteve e se tornou mais maduro. “Sinto a mesma força que me motivou desde sempre. Mas houve um amadurecimento meu em relação aos limites entre a criatividade da trama que está sendo contada no momento atual e as lacunas do passado. Antes, eu ficava mais preocupada em preencher todas as brechas. Hoje, contudo, entendo que várias delas não serão preenchidas e nem por isso a história deve deixar de ser contada”, pondera a também roteirista.

Com o intuito de estabelecer diálogos entre o ontem e o agora, o volume dois de Beco do Rosário alcança leitores justamente em dias de suspensão social, sendo a obra uma oportunidade de caminhar por lugares públicos com uma liberdade que, por enquanto, não é recomendada fora dos livros.

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