[Este texto integra uma série de relatos produzidos pela equipe de atendimento educativo do Itaú Cultural (IC). Nesses relatos, cada educador comenta sua experiência relacionada a uma exposição apresentada no IC, destacando três das obras presentes na mostra.]

por Victória de Oliveira

A artista Sandra Cinto é desenhista, pintora, escultora, gravadora e professora. Usa em seu trabalho linhas e traços como base para a criação de diversas paisagens. Além do desenho, ela se utiliza de modalidades como instalações e esculturas para compor as suas obras, muitas das quais causam reflexões e estímulos em quem as observa.

Neste texto falaremos um pouco sobre o trabalho de Sandra com o recorte na relação entre três de suas obras. Essas produções contêm diversos pontos de conexão, mas aqui serão levantadas a questão da não efemeridade do desenho e a consideração que a artista faz sobre o ato de desenhar não ter delimitações.

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A seguir, conheça três obras de Sandra Cinto e suas relações com o efêmero.

O Desenho Não Tem Fim, 2010
vídeo | video, por Renata Ursaia
gravação sobre Imitação da Água (2010), de Sandra Cinto, obra que integrou a exposição no Instituto Tomie Ohtake

O vídeo encontra-se disponível no YouTube.

A primeira obra, O Desenho Não Tem Fim, é um vídeo/entrevista feito pela Renata Ursaia a respeito do desmonte de uma das obras de Sandra, Imitação das Águas (2010), que foi exposta no Instituto Tomie Ohtake. Nesse material a artista fala sobre sua relação com os desenhos de paisagens e com o tempo.

Não existe a hora em que o desenho está pronto, o que me leva a pensar que para Sandra a ligação com a obra vem de um lugar sensível, no qual a artista não se prende ao tempo ou a um resultado, mas, sim, a uma busca para deixar nítidas as sensações vividas por ela e a preocupação de causar essas sensações no observador. 

Sandra reconfigura alguns conceitos de arte e pintura, fazendo com que o desenho seja algo livre e que pode se manifestar em qualquer lugar. Como no vídeo e em diversos de seus trabalhos, os desenhos e as pinturas são feitos em paredes ou em qualquer outra superfície não conservadora. Outro parâmetro dessa reconfiguração é o chamado site specific, em que a obra é criada ou dedicada para o seu local de exposição, fazendo com que muitos dos trabalhos da artista sejam únicos e vivam temporariamente. Essa ação me leva a pensar que a obra é efêmera, mas não a ação de desenhar.

Sem Título, 2010
caneta permanente e acrílica sobre tela
250 x 160 cm
coleção Rose e Alfredo Setubal
foto: Everton Ballardin

Na segunda produção, que não tem título, nos deparamos com uma pintura – feita de tinta acrílica e caneta permanente sobre tela – que retrata o mar, temática que também foi abordada na primeira obra. Nela podem ser observados os detalhes de traços e espacialidade feitos pela artista, o que nos dá a impressão de imersão, parecendo que estamos mesmo dentro desse mar revolto que é retratado. 

Aqui a não finitude não está ligada ao local que essa obra ocupa ou ao tempo de sua fabricação, mas, sim, à sensação que o desenho quer nos causar, de estar dentro de um mar infinito e que é colocado pela forma como a artista faz cada linha de seu desenho. Nós nos sentimos imersos como se fôssemos um personagem dessa história sobre tempestade.

Noites de Esperança, 2006
acrílica e caneta permanente sobre MDF
coleção Acervo Banco Itaú
foto: Ricardo Amado

Outro aspecto são as inspirações e referências para a criação artística, o que nos leva à terceira obra, Noites de Esperança, pintura feita em 2006 com tinta acrílica e caneta permanente sobre MDF (placa de madeira). O trabalho tem como viés o diálogo direto com a pintura A Festa da Abolição na Ilha de Paquetá, de Émile Rouède. A artista menciona que em sua pintura “os fantasmas dos fogos de Paquetá foram promessas até hoje não cumpridas de emancipação dos afrodescendentes desde o 13 de Maio”, fazendo assim, ao meu ver, uma alusão ao contexto abolicionista, ao que disso carregamos até hoje e à manutenção da esperança para melhora e progresso. 

Uma característica para ser notada nessa obra diz respeito à sua composição. A produção é formada por seis placas de MDF individuais, que, quando colocadas juntas, se complementam. Uma das leituras possíveis para isso pode ser a do espaço infinito que o desenho pode ocupar, sendo esse espaço físico ou dentro de nossa própria imaginação.

Para mim, o desenho pode não caber em um lugar específico, não há limitação para essa ação. O desenho pode transbordar para outros espaços e ser complementado. Ele pode não ser único, solitário. As possibilidades para o ato de desenhar são infinitas. 

Para conhecer mais sobre o trabalho da artista, clique aqui.

Sobre mim:

Meu nome é Victória de Oliveira e tenho 24 anos. Sou formada em música e faço pós-graduação em tradução e intérprete de Libras. Trabalho como arte-educadora há cerca de cinco anos e já atuei em diferentes instituições culturais. Trabalhei como professora e oficineira em escolas das redes pública e privada. Atualmente, atuo como educadora no IC, onde trabalho há 11 meses.

Para além da arte-educação, também desenvolvo trabalhos com música e poesias autorais, slams e produção cultural.

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