Narrativas é a sétima série produzida aqui no site que destaca produções de artistas presentes na coleção de obras de arte do Itaú Cultural (IC). A cada publicação, um escritor é convidado a criar um texto literário inspirado em uma obra do acervo. Nesta edição, escreve Milena Buarque.

Fundeada, encouraçada, como que blindada, atracada. Destino a minha bravura a morrer em paisagens, em edificações muito próprias, de quem aceita a partida, mas não está para o brio da chegada. Alguma honra deve haver em nunca se deixar inundar. Acanhada e inconstante, vivo sob o jugo do que me é externo. Contudo, atravesso, com falsa obstinação e tamanha indiferença, o que busca dilacerar-me, sem nenhuma marca interna de debilidade. Ancorada, revirada e repuxada, suspiros me inflam e vem o assombro: como?

Oca, derramada, aliviada. O sol me toma, me esgarça e desfia. Ensejo ranger ao luar. Sou, enfim, bote a seco na praia. Ou seja, vista no tempo particular dos enquantos e dos escassos. Passam-se os dias, varadouro entre danças, tertúlias e gaitadas. Ancorada, revirada e repuxada, num espasmo, estou molhada, embebida. Em cada racha, sulco espumante a ocupar e espanto: como?

A minha alma é uma paisagem escolhida. E, em elevação, sou chalupa cruzadora a navegar.

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Todos os textos, nas várias curadorias, sobre obras do acervo do Itaú Cultural

Castagneto, “Niterói, Marinha com Barcos” (s.d.) | óleo sobre tela | 24,5 x 41 cm | Acervo Itaú Cultural
Castagneto, “Niterói, Marinha com Barcos” (s.d.) | óleo sobre tela | 24,5 x 41 cm | Acervo Itaú Cultural (imagem: Iara Venanzi/Itaú Cultural)

Milena Buarque é jornalista, mestranda em história, política e bens culturais [Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, da Fundação Getulio Vargas (CPDOC/FGV)] e coautora de Quarta capa: o livro sobre livros (2019), livro-reportagem publicado pela Casa Flutuante. No IC, é editora de conteúdo.

Giovanni Battista Felice Castagneto (1851-1900) foi pintor, desenhista, professor e restaurador. Exerceu a profissão de marinheiro em Gênova, na Itália. Acompanhado de seu pai, chegou ao Rio de Janeiro em 1874 e matriculou-se, quatro anos depois, nos cursos de desenho figurado, desenho geométrico e matemática na Academia Imperial de Belas Artes. É conhecido por sua grande contribuição com trabalhos relacionados à paisagística brasileira, com destaque para a questão marinha, do final do século XIX. Saiba mais sobre o artista na Enciclopédia Itaú Cultural de arte e cultura brasileira.

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