Por Cristiane Santos
Júnia Pereira nasceu em Caarapó, em Mato Grosso do Sul, e ainda criança se mudou para Minas Gerais. Voltou ao estado natal em 2015 para lecionar dramaturgia na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e custou a acreditar quando viu o espaço de sua nova casa: “Eu morava em um apartamento de 30 metros quadrados em Belo Horizonte. Quando vi aquele quintal gigante, fiquei deslumbrada e achei que era um desperdício tudo aquilo só para mim”, conta ela.
Nascia ali a ideia e o cenário inicial da Mostra Solo de Quintal. Produzido com o apoio do Rumos Itaú Cultural, o projeto apresenta espetáculos solo de artes cênicas no intimismo de quintais da cidade de Dourados.
Valorizando a produção independente e uma relação mais próxima entre artistas e espectadores, o festival começou na casa de Júnia e sua esposa, Dulcinéa, e se expandiu por outras residências, movimentando a agenda cultural local com atrações de origens, propostas artísticas e temáticas diversas – e preços populares.
Além do quintal de Júnia e Dulcinéa, fazem parte do circuito o Quintal Casulo, o Quintal Casa dos Ventos e, em dias de chuva, o espaço Sucata Cultural. Essa rede de parceiros acabou preenchendo uma lacuna no acesso a espetáculos desse tipo, “já que o concorrido teatro municipal da cidade oferece conteúdos mais comerciais em sua grade e, não raro, é palco de eventos sociais de todo porte”, explica Júnia.
Em 2017 serão apresentadas 19 montagens, três vezes por mês, durante todo o ano, vindas de estados como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. A programação é elaborada por meio de uma chamada pública via redes sociais.
A maioria dos espetáculos quase não tem cenário, figurinos ou outros elementos cênicos, adaptando-se à lógica dos espaços. E toda a divulgação – feita por meio de jornais locais, carros de som, cartazes e filipetas distribuídas pela cidade e por canais como Facebook e YouTube – fica a cargo de Júnia e seus parceiros.
As equipes dos espetáculos ficam de três a cinco dias na cidade, hospedadas no “Quintal Du e Júnia”, compartilhando com as anfitriãs as refeições e os papos na soleira. Assim, acabam aprofundando as conversas sobre o fazer artístico e o intercâmbio de culturas.
Entre um tereré – o mate do sul-mato-grossense – e outro, “as pessoas enxergam tudo com um olhar novo. Quem vem de fora fica curioso com a cidade, quer conhecer as aldeias indígenas e a feira livre. Os daqui também se inspiram, se projetam em outros modos de trabalho”, conta Júnia. “Aqui, como temos baixa densidade demográfica, a ocupação do espaço é diferente. É fácil se encantar com o tempo, que aqui parece correr mais devagar.”