Por Amanda Rigamonti
O que é a fotografia? Que sentidos usamos e quais movimentos fazemos no ato de fotografar? Sentirgrafia busca ampliar o entendimento dessa ação e, para isso, divide-se em duas etapas: na primeira, realizará oficinas de fotografia para pessoas cegas e com deficiência visual que vivem no Piauí; na segunda, produzirá um documentário a partir do registro desses encontros.
Manoela Meyer, proponente do projeto, conta que a inspiração veio depois de ter trabalhado em um documentário que explorava a percepção que as pessoas cegas têm do audiovisual. “Esse trabalho foi mais ativista, por causa da audiodescrição, mas, quando comecei a fazê-lo, queria que fosse uma coisa muito mais sensorial, e eu não consegui isso porque na hora achei que valia mais a pena ser ativista mesmo, levantar bandeira e ir atrás disso”, explica. “Fiquei muito com essa sensação de que queria voltar a trabalhar com a temática da cegueira.” Durante esse processo, Manoela conheceu alguns profissionais da área de fotografia que são cegos, o que a instigou a pensar no que viria a ser o Sentirgrafia. Para a realização do projeto, somaram-se a ela André Sakiyama, Daniel Lolo, Joyce Cury e Otávio Almeida.
Nas oficinas – que acontecem em Agricolândia (de 10 a 14 de julho), Campo Maior (de 17 a 21) e Teresina (de 24 a 28) –, o grupo propõe exercícios de percepção de espaço e corpo e leva artifícios que exploram os outros sentidos, como músicas e trechos de cordel – a partir dos quais os participantes são provocados a imaginar cenas –, e imagens de outros fotógrafos apresentadas de maneira tátil, para discutir enquadramento, composição, tipos de fotografia (de natureza, de rua, retrato) e outros elementos que envolvem essa arte. “Ansel Adams falou, quase um século atrás, que na nossa fotografia estão todas as músicas que a gente ouve, os livros que a gente lê, os filmes a que a gente assiste, então a fotografia não é simplesmente o visível; existem outras referências de coisas que a gente aciona para poder construir a imagem. Não se distancia muito [do vidente para o cego]”, diz Joyce, que comanda as oficinas, sobre ser uma vidente ministrando esses encontros.
No último dia de cada oficina os participantes são convidados para uma saída fotográfica, em que podem colocar em prática o que discutiram e aprenderam na atividade. A respeito da escolha do Piauí, Manoela explica que o estado é o que tem a maior concentração de cegos na população – 22%.
O documentário, ainda sem previsão de lançamento, será gravado durante os encontros, e nele o grupo pretende forçar o espectador a se colocar no lugar de um cego. Os realizadores conversaram e refletiram sobre como passar essa sensação sem usar de artifícios que consideram já muito usados, como a tela preta e o desfoque. Assim, pensando em maneiras de fugir desses recursos, conseguiram construir a proposta do trabalho. “Vamos fazer um filme que seja o processo de criar alguma foto e não vamos revelar essa foto”, diz Manoela.
Ela conta que a ideia é que o espectador tenha acesso ao processo de construção da foto – onde o fotógrafo está inserido, como ele se posiciona, os ângulos que explora. E, como a ideia é não mostrar o resultado, o grupo escolheu apresentar essa foto a partir da audiodescrição – nesse caso, a descrição da foto –, feita por pessoas que não saberão que ela foi produzida por um fotógrafo cego. “O vídeo final que vamos produzir com o projeto são os processos, a coreografia, a inserção desse fotógrafo num espaço dado e, em off, pessoas descrevendo as fotos que foram produzidas”, conclui.
O grupo iniciou no dia 10 de julho a primeira etapa das oficinas e fica em Agricolândia até o dia 14. Eles seguem para Campo Maior (de 17 a 21) e Teresina (de 24 a 28). É possível se inscrever para participar dos próximos encontros pelo e-mail sentirgrafia@gmail.com (não é necessário possuir máquina fotográfica; todos os equipamentos utilizados na oficina serão disponibilizados pelo grupo).