Por Victória Pimentel

“Nós nos miramos nos músicos e atores de rua e nos artistas circenses, que há gerações estão acostumados a trabalhar fora, a viajar de cidade em cidade, com uma estrutura mambembe e uma relação muito próxima com o público”, conta Simone Peixoto, integrante do Xilomóvel Ateliê Itinerante e uma das responsáveis pela curadoria do Festival Volante, projeto selecionado no programa Rumos Itaú Cultural 2015-2016. O evento – que acontece nos dias 10 e 11 de dezembro, na Estação Cultura, em Campinas (SP) – reúne nove grupos artísticos e investe na mobilidade como modo de aproximar o público das artes visuais.

O Xilomóvel Ateliê Itinerante desenvolve oficinas de xilogravura
O Xilomóvel Ateliê Itinerante desenvolve oficinas de xilogravura

 

A ideia do festival já é antiga: desde que o Xilomóvel foi criado, Simone, Luciana Bertarelli, Marcio Elias e Thiago Fernandes – integrantes do grupo e também curadores do evento – vinham buscando outros ateliês de estrutura itinerante que trabalhassem com artes visuais. Essa procura deu origem a um novo projeto: um encontro entre esses grupos – Xilomóvel, Grafatório, Sericleta e Ateliê Nômade –, materializado em uma exposição em junho de 2015 no AT AL 609 Lugar de Investigações Artísticas. No ano seguinte, em parceria com a produtora Confraria dos Ventos (comandada por Guga Costa), os quatro ateliês se uniram aos coletivos e artistas Paraísos Íntimos, Fotomóbil Narrativas de Luz, Julia Goeldi, L.Amb – Laboratório Ambulante e Oficina do Olhar a fim de ampliar o encontro, promovendo oficinas e levando a arte visual para mais perto dos mais diferentes públicos.

Simone conta que o Festival Volante foi criado principalmente para que as pessoas tivessem acesso a técnicas gráficas pouco conhecidas, como xilogravura, serigrafia e processos de fotografia analógica. “Através do Xilomóvel, já experimentamos as mais diversas formas de aproximar a xilogravura do público, como oficinas, cursos, exposições e palestras, e tivemos um retorno maravilhoso”, explica. Com a realização do festival na Estação Cultura, espaço localizado no centro da cidade de Campinas, que funciona constantemente como passagem, essas possibilidades seriam estendidas. “A ideia de levar o trabalho ao público – invertendo o conceito de que as pessoas devem ir até o trabalho do artista – nos encanta”, pontua a curadora. “A mobilidade é uma forma de atingir um público diverso, que não está habituado a frequentar espaços de arte, como museus, galerias e escolas de arte. Além disso, quando você leva o trabalho aonde o público está, a relação com a arte é diferente. Ela tem um caráter mais leve, mais lúdico. As pessoas se sentem menos inibidas, porque estão em seu próprio espaço.”

Programação

Cada ateliê que participa do evento ministra uma atividade – gratuita – sobre as mais diferentes técnicas gráficas. Três grupos comandam oficinas relacionadas a processos de revelação de imagens. O Fotomóbil Narrativas de Luz desenvolve um livro-sanfona sensível à luz, e os participantes são convidados a intuir narrativas ao positivar imagens. Os ateliês L.Amb – Laboratório Ambulante e Oficina do Olhar criam processos analógicos em diferentes tipos de câmera: o L.Amb em uma câmera Pin-Hole e a Oficina do Olhar em câmeras lambe-lambe e câmeras de caixote.

O Ateliê Nômade e o Xilomóvel, por sua vez, apresentam oficinas específicas sobre xilogravura, enquanto a Sericleta utiliza uma bicicleta para fazer impressões em serigrafia. Os coletivos Paraísos Íntimos e Grafatório fazem uso de múltiplas técnicas gráficas em suas atividades, entre elas gravura, monotipia, colagem, desenho, linoleogravura e tipografia. Já a artista Julia Goeldi utiliza a água-tinta para criar desenhos de paisagens.

Sobre as técnicas abordadas durante a programação, Simone conta que “todas fazem parte do universo gráfico: técnicas de captura (fotografia) e reprodução (gravuras) de imagens, através das quais se pode compreender todas as etapas dos processos de criação de imagem”. Absolutamente analógicas e manuais, “todas foram criadas com alguma aplicação técnica ou industrial e ficaram obsoletas, mas foram resgatadas por artistas que as escolheram por suas qualidades visuais”. Nas atividades práticas, as pessoas “colocam a mão na massa”. Através da experiência, as técnicas se desmistificam e as pessoas se sentem mais próximas delas. “Não adianta muito tentar explicar teoricamente tudo isso a alguém que não conhece nada do assunto, porque essas coisas parecem muito distantes, abstratas e difíceis”, explica a curadora.

Na cidade

Além das oficinas artísticas, o festival traz a AroE – Biclicletas Geradoras. Na atividade, pelo ato de pedalar, os participantes geram energia para a exibição de pequenos filmes. Ao final de cada dia, o evento apresenta também atrações musicais. No dia 10, a banda de surf music e rock instrumental The Dead Rocks sobe ao palco, enquanto no dia 11 é a vez do grupo franco-brasileiro Čao Laru.

Segundo os organizadores, a ideia é atingir um público o mais amplo possível: de crianças a idosos de todas as camadas sociais, tanto pessoas que já conhecem as artes gráficas e se interessam por elas como aquelas que nunca ouviram falar dessas técnicas. Esse intuito se relaciona diretamente com a realização do evento em um espaço não convencional. Além de dialogar com um público que não está necessariamente em busca de contato com a arte, o festival contempla “o desejo de ocupar a cidade de forma transformadora”, segundo Simone. “De alguma maneira, existe um posicionamento político nesse trabalho que realizamos, pois acreditamos que o uso dos espaços públicos é possível e necessário para construir uma cidade mais humana, uma cidade em que as pessoas se relacionem mais e onde aconteçam mais trocas de experiências e de conhecimento entre elas”.

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