obra: Até o Caminho
selecionado: Tokyo Filmes
É possível viver de cinema hoje no Brasil? Apesar das dificuldades, há exemplos que mostram que sim. E não estamos falando de nomes consagrados, mas de novas iniciativas e novos grupos. Um deles vem de Porto Alegre e responde pelo nome Tokyo Filmes. A produtora – fundada, em 2009, pelos amigos Bruno Carboni, Davi Pretto, Paola Wink e Richard Tavares – prepara agora seu segundo longa-metragem, Até o Caminho, selecionado no programa Rumos.
Algumas coincidências contribuíram para que eles se unissem em torno da sétima arte. Pretto conta que escolheu a faculdade de cinema meio “ao acaso”, mas logo descobriu que dois grandes amigos de escola, Carboni e Tavares, também fariam o curso. Já na universidade, Paola se afinou com o grupo e pronto: saíram dali já com a Tokyo formada.
Ainda na faculdade, surgiu o primeiro trabalho, o curta-metragem Quarto de Espera, que os levou para diversos festivais na Europa. Vieram outros curtas e o primeiro longa, Castanha, exibido no Festival de Berlim deste ano (um dos quatro longas brasileiros) e que deve estrear no Brasil no segundo semestre de 2014.
O enredo é um misto de ficção e documentário sobre a vida de João Carlos Castanha. O filme foi feito com recursos escassos, uma equipe bem reduzida e a colaboração de amigos. “Há atores e não atores vinculados ao Castanha ou a mim. A minha mãe atua no filme fazendo uma personagem que não é ela”, revela Pretto, responsável pelo roteiro e direção.
Afinidades
Bruno Carboni, Davi Pretto, Paola Wink e Richard Tavares dividem ainda o ano de nascimento, 1988, e uma relação aberta e de diálogo estreito. De forma natural, cada um foi ocupando uma posição na produtora. Pretto na direção, Tavares assinando roteiro e direção de arte, Carboni na edição e Paola na produção. Mas isso não é algo fechado. Há alternâncias. Além de Até o Caminho, que será dirigido por Pretto, eles planejam outro longa, Colônia, que terá Tavares no posto de diretor.
Os quatro também compartilham projetos e ideais semelhantes. A produtora, por exemplo, não tem uma sede física. “Nós trabalhamos de uma maneira mais horizontal, mais livre. Isso nos dá mais tempo e espaço para produzir criativamente”, explica Pretto, que até o momento brinca que ainda não “morreu de fome ou foi despejado”. “E estamos sempre produzindo, com ou sem dinheiro”, acrescenta.
Até o Caminho
Embora não venha de uma família de artistas, Pretto conta que sempre viu na mãe uma referência. “Ela foi bancária a vida inteira, mas gosta muito de literatura e, de certa forma, isso me influenciou. A vida é muito banal, muito rasa às vezes, e ela me passou isso de saber observar, ouvir, ter interesse pelo outro”, destaca.
Esse olhar e a vontade de contar histórias de personagens “com visões e sensações singulares perante o mundo”, já visto nos outros trabalhos de Pretto e da Tokyo, permeiam também Até o Caminho. O filme surgiu de diversas viagens feitas por ele e por Tavares por regiões do extremo sul do país, bem afastadas dos grandes centros urbanos. O enredo é também uma adaptação do conto “El Niño”, escrito por Tavares, que assina ainda o roteiro do filme.
Até o Caminho conta a história de Francis, um jovem estranho que vive em um desses lugares bem afastados com a família, onde os pais são caseiros de uma grande fazenda. Arisco e impulsivo, ele busca refúgio em uma cachoeira abandonada, mas começa a se incomodar com os turistas de verão, passando a atirar nos carros que transitam pela estrada. “Neste projeto a intenção é imaginar como um jovem diferente e peculiar, com incapacidade de interação e comunicação, viveria em um ambiente tão inóspito e isolado do extremo sul de um país tão grande. Um lugar quase despencando do mapa”, explica Pretto.
Para conhecer mais dessa realidade, a Tokyo roda antes o documentário Metade Homem, Metade Fantasma, que será um registro de uma família de caseiros do interior do Rio Grande do Sul.