“Relatório Nostradamus”: documento estuda tendências do setor audiovisual
22/09/2021 - 17:44
A pesquisa Hábitos culturais II, realizada pelo Itaú Cultural (IC) em parceria com o Instituto Datafolha, revelou que, entre as atividades culturais que mais fazem falta neste período de distanciamento social, o acesso às salas de cinema foi apontado por 67% dos entrevistados. Ao mesmo tempo, o consumo de filmes e séries em plataformas de streaming continuou a crescer durante a pandemia, tendo sido citado por 79% dos participantes.
Nesse cenário, é preciso olhar também para a gestão do setor audiovisual. Quais são as tendências apontadas para todos os elos da cadeia do audiovisual (produção, distribuição, exibição e consumo) nos próximos anos? E como é possível se reorganizar para atender às novas demandas e oportunidades? O documento Nostradamus report: transforming storytelling together [Relatório Nostradamus: transformando juntos as narrativas], elaborado pela finlandesa Johanna Koljonen, analista de mídia, prevê tendências dessa indústria.
Koljonen foi uma das convidadas da edição deste ano do Encontros de cinema – gestão do audiovisual e apresentou o relatório em uma masterclass – o vídeo segue disponível no YouTube do IC, com áudio original e tradução em português. O Nostradamus foi elaborado com base em pesquisas e entrevistas com especialistas da indústria.
>> Acesse o relatório na íntegra em inglês
Segundo o documento, rupturas envolvem destruição. Se, por um lado, os efeitos econômicos e psicológicos decorrentes da pandemia de covid-19 poderão ser sentidos, no mínimo, durante os próximos dois anos – refletidos no fechamento de empresas e na mudança de profissionais para outras áreas de trabalho, por exemplo –, por outro, a audiência de conteúdos audiovisuais deve continuar faminta – especialmente com os limites entre cinema e “mídias vizinhas” diminuindo cada vez mais.
Johanna aponta no relatório: “Livrar-se de ineficiências estruturais e gargalos de distribuição abre a possibilidade de novas formas de conectar cada tipo de conteúdo com uma audiência que realmente se importa”. O momento pode trazer novas oportunidades para o setor e moldar normas da indústria, fluxo de trabalho, modelos de negócios e formas de contar histórias para os próximos cinco anos.
“Stakeholders menores – empresas pequenas, emissoras públicas, exibidores independentes, festivais, operadores de streaming de nichos – podem se unir para dividir e redistribuir recursos, habilidades e alcance. Autores individuais ou grupos de criadores podem negociar termos melhores – ou escolher evitar totalmente distribuidores históricos. Nada é definitivo, e nós temos flexibilidade sobre esses resultados. Iremos transformar juntos o modo de contar histórias”, ressalta outro trecho do relatório.
>> Veja a entrevista com áudio original
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Confira abaixo alguns pontos destacados em cada capítulo.
1. Situando-nos na realidade
É esperado que a pandemia continue afetando a indústria audiovisual pelos próximos dois ou três anos, fazendo com que mudanças estruturais que já estavam em progresso se intensifiquem até uma consolidação. Segundo o documento, o tempo para inovação e adaptação dos novos modelos também se fecha mais rapidamente. O relatório ainda avalia a indústria cinematográfica como um setor robusto, mesmo em um cenário de transformações; contudo, empresas e profissionais autônomos podem acabar cedendo à pressão da pandemia. As experiências de 2020 mostraram que a indústria audiovisual é afetada pelos contextos sociais e macroeconômicos e, por isso, é importante aumentar a consciência sistêmica sobre a cadeia como um todo.
2. Produções virtuais desbloqueiam a criatividade – e oportunidades
O relatório aponta que, em cinco anos, todos os fluxos de trabalho, métodos e ferramentas utilizados para produções virtuais estarão completamente incorporados e normatizados em toda a indústria. Ainda prevê que os fluxos de trabalho mudarão para enfatizar o processo de pré-produção e fortalecer a colaboração artística entre diferentes departamentos. Devido aos processos semelhantes, formatos e mídias que antes estavam distantes irão parcialmente convergir para criar novas narrativas em multiplataformas.
3. Transformações nas salas de cinema
A exibição nas salas de cinema não está morrendo, mas, sim, se modificando. A estimativa é de que em cinco anos a indústria tenha uma menor quantidade de salas operando no modelo atual, mas, ainda assim, com um bom desempenho de bilheteria – mesmo com os serviços de streaming em alta. O fechamento de salas na pandemia pode criar oportunidades de exibições experimentais, em ambientes revitalizados.
4. No coração da indústria, uma pequena tela
Os gastos domésticos com vídeo sob demanda serão maiores e combinados com modelos de negócios complementares. O relatório também destaca que conteúdos exclusivos não serão centrais para essas estratégias. Com o lançamento nas salas de cinema não sendo mais uma definição de qualidade do produto, a tela pequena será o coração financeiro e, possivelmente, artístico da indústria de filmes e televisão. Essas inovações serão impulsionadas pela audiência de um público mais jovem, que escolhe consumir e produzir fora dos domínios tradicionais.
5. Do sistema de janelas para o conteúdo
Qual forma a distribuição tomará quando o sistema de janelas for determinado pela inovação da cadeia de valor nos próximos três anos? Departamentos de vendas e distribuição devem investir em uma compreensão profunda da audiência e usar melhor os dados disponíveis para permanecer relevantes para ela. Com o acesso ao investimento público restrito, a iniciativa privada ganha relevância, mas também se torna mais seletiva.
6. Mudanças globais, oportunidade europeia
Com o crescente interesse em conteúdo de todo o mundo, há uma oportunidade histórica para a produção europeia. Embora seja esperado que a quantidade de longas-metragens diminua, o volume como um todo deve se fortalecer.
7. Audiovisual Media Services Directive (AVMSD): implementação aponta necessidade de mudança de políticas
O requisito da diretiva da AVMSD nas operações dos serviços de streaming no mercado europeu mostra que pelo menos 30% do conteúdo produzido no continente é cada vez mais visto como vantajoso. O investimento internacional na produção local está crescendo. A implementação da diretiva aponta para um passo à frente da tão esperada coerência entre a política cultural estrutural e os objetivos nacionais tanto para emissoras locais quanto para uma indústria audiovisual mais ampla.