obra: Imagens Expandidas
selecionado: Julia Grillo Botafogo
Em 2010, a produtora cultural Julia Grillo Botafogo estava morando no Marrocos, como parte de sua pesquisa de mestrado em gestão cultural, quando foi presenteada com uma pequena câmera e passou a registrar tudo o que via. “Aí me descobri como fotógrafa”, revela.
De volta para o Brasil, a vontade era aprender mais sobre esse universo. O caminho mais óbvio seria se matricular em um curso. Julia, porém, teve outra ideia: escrever um projeto e convidar quem admirava para compartilhar conhecimentos e trabalhar com temas que a motivavam. Nascia ali, ao lado da amiga Luiza Cilente, o Lab’s 2.0, um laboratório livre para a prática fotográfica.
Julia e Luiza conseguiram um pequeno financiamento e promoveram 12 encontros para o desenvolvimento da iniciativa com foco na reflexão sobre as mudanças e as transformações observadas no Rio de Janeiro, especialmente na zona portuária – essa região passa por obras de revitalização, que aos poucos vêm causando impactos na vida urbana local.
Com base nessa experiência, foi formado o Coletivo Fotografia Expandida, que começou a desenvolver atividades e oficinas com outros grupos culturais e moradores da região.
Esqueça câmeras digitais e impressão. O coletivo recupera o “processo mágico” de revelar fotos. Como é necessária certa estrutura para viabilizar isso – bandejas, pinças, química, lâmpada vermelha e nenhuma entrada de luz –, foi montada uma cabine-laboratório, o que permitiu essa ampliação das atividades.
“Descobrimos que juntos poderíamos continuar exercitando e compartilhando os aprendizados, pensando e refletindo sobre o fazer fotográfico. Criamos uma cabine e com ela interagimos com diversos grupos da região, criando assim alguns elos afetivos”, salienta Julia.
Pretos Novos
Em parceria com o Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPN), o novo projeto do coletivo, selecionado pelo Rumos, é trazer o Laboratório de Fotografia Expandida para documentar um conjunto de conteúdos sobre as práticas e os processos criativos que envolvem a arte e a cultura negra na região portuária.
O IPN guarda uma das mais importantes descobertas arqueológicas e históricas do Brasil: um cemitério secular de negros vindos da África, que foi encontrado quando donos de uma casa construída no início do século XVII na Gamboa iniciaram uma reforma no local, em 1996. Desde então, o cemitério se tornou um ponto de reflexão sobre a escravidão no Brasil.
O objetivo do laboratório é possibilitar um espaço de experimentação e documentação fotográfica para que se possam discutir os espaços simbólicos relacionados à arte, à memória e à cultura da população negra da região portuária, por meio do envolvimento de artistas e moradores.
Com base nesses encontros e experimentações, o resultado será apresentado em um site do coletivo, que deverá ser lançado em janeiro de 2015.
“[...] a região portuária carioca é rica em história e cultura africana – local onde desembarcavam os escravos trazidos para trabalhar na cidade –, embora precária em serviços públicos e infraestrutura. Com o intuito de contribuir para a visibilidade da vida e do cotidiano de seus habitantes, o coletivo busca, nas práticas alternativas de fotografia, uma forma lúdica e crítica de compor novos imaginários em constante diálogo com a potência da vida em luta para permanecer em meio às reformas urbanas impostas”, defende Julia.